O Social Bauru conversou com Archimedes Raia Junior, ex-presidente da Emdurb, professor, pesquisador e PHD em Engenharia do Transporte. A nosso pedido, o professor da UFSCAR (Universidade Federal de São Carlos) deu algumas propostas para melhorar o trânsito de Bauru, na região da Praça Portugal, além de apontar a melhor solução, na sua opinião, para a bifurcação existente no final da Avenida Getúlio Vargas e de esclarecer como deverá ser o futuro do trânsito no Brasil.
“As pessoas vão entender que o transporte coletivo é uma alternativa. Mas não é este transporte coletivo. Então, quando a gente fala deste conceito da substituição, as pessoas associam de que irão usar este ônibus. Mas não é este. A substituição para o transporte coletivo tem que ser de qualidade”, afirma.
Confira:
Qual o maior erro ali na Praça Portugal? Ou não tem nenhum erro?
Archimedes: Eu acho que não existe um erro. O problema foi causado pela evolução. O número de carros foi aumentando, assim como a população, e os problemas vão surgindo… Na época em que uma solução foi proposta, ela funcionava. Hoje, já não funciona mais. Então, ali na Praça Portugal, mais precisamente na Rua Gustavo Maciel, existe um entrelaçamento de quem vem pela Rua Rubens Pagani e quer pegar a Getúlio Vargas ou a Gustavo Maciel. A solução para estes problemas de trânsito não são, muitas vezes, tão simples… Como é o caso ali… porque o cruzamento é relativamente complexo. E se torna ainda mais complexo com a Gustavo Maciel, na parte de cima da Rua Rubens Pagani. É um entrelaçamento bem complexo. Além disso, existe uma conversão à esquerda, livre, na Rubens Pagani com a Gustavo Maciel. E eu vejo que esta conversão não funciona bem hoje. Mesmo assim, não dá para dizer que existe uma única solução. Existem várias possíveis e que precisam ser estudadas de uma maneira mais ampla. No caso deste cruzamento, por exemplo, os impactos não ocorrem só ali, mas têm interferência em uma região maior. Uma proposta imediata seria fechar o acesso da Gustavo Maciel naquele ponto, assim como a conversão à esquerda na Rubens Pagani. Claro que, como todas as propostas, esta também precisa ser aprofundada. Mas, se você fecha o acesso à Rua Gustavo Maciel e faz o retorno na loja Roth – para quem chega ali, naquele ponto – também é preciso inverter o semáforo que existe na Getúlio Vargas, mais adiante.
Então não é impossível resolver?
Archimedes: Não é. Mas quando a gente procura soluções para o trânsito, elas não são pontuais. Claro que você faz algo pontual, na medida do possível, mas você tem que atender o coletivo.
Ali não formaria um trânsito maior?
Archimedes: Não, mas teria que alterar a sinalização do semáforo. Na Gustavo, na confluência da Getúlio com a Rubens Pagani, teria que colocar um semáforo. Então, o acesso da Rubens Pagani na Getúlio, seja para um lado ou para o outro, seria feita com semáforo, de uma forma que você tivesse só a Getúlio passando pela quadra do posto ou possibilitando conversão só à esquerda. Elimina-se o entrelaçamento, porque a Getúlio teria toda a faixa livre, assim como a conversão da Rubens Pagani, à esquerda, também teria. E isso não afetaria muito o comércio do local.
E a Praça Portugal não pode ser mexida, né?
Archimedes: Não pode, pois se trata de uma área verde, que precisa ser preservada. Hoje, nós temos a praça… O trânsito fica impossível ali nos horários de pico porque tem estacionamento dos dois lados e o carro só pode passar por uma única faixa. Olha, a Engenharia de Tráfego não tem muito segredo… Ela trabalha com capacidade e segurança. Então, se você quer uma rua com muito estacionamento, tem baixa fluidez. Mas se você quer fluidez, reduz o estacionamento. Normalmente, começa-se reduzindo de um dos lados até retirar tudo.
Como é a Duque de Caxias hoje, né?
Archimedes: A retirada foi na época em que eu era diretor da Emdurb e foi uma heresia falar em tirar a opção do estacionamento. Uma coisa absurda na época!
Existe algum lugar aqui, em Bauru, que tenha tido uma mudança muito boa que possa servir como exemplo?
Archimedes: Uma coisa simples foi a colocação dos semáforos na Rua Comendador José da Silva Martha. Muitas pessoas até acharam ruim, mas, do ponto de vista técnico, foi fundamental. Este é o exemplo típico de que a colocação do semáforo não é por conta só do alto índice do movimento em uma via. Existem alguns critérios para isso. Mas são coisas que precisam ser feitas. A partir do momento em que todo mundo opta pelo carro, começam os problemas.
Mas também, tem o ponto de que o transporte coletivo não é bom, né?
Archimedes: Sim. Inclusive, vou dar uma palestra, em agosto, sobre isso, aqui na cidade. Será um debate exatamente sobre isso. E as pessoas vão entender que o transporte coletivo é uma alternativa. Mas não é esse transporte coletivo. Então, quando a gente fala deste conceito da substituição, as pessoas associam de que irão usar esse ônibus. Mas não é esse. A substituição para o transporte coletivo tem que ser de qualidade. Na Europa, por exemplo, o trem é até melhor que o avião. Então, se for nesses países da Europa, verá que áreas centrais não permitem mais automóveis particulares. Você pode ir com o seu carro até um ponto e deixa-lo em um estacionamento grande, preparado para isso. E aí segue a pé ou de transporte coletivo. E lá, usar metrô, ônibus ou trem é normal. Em Lisboa, por exemplo, que não é um local tão evoluído, mas é muito fácil de andar, você circula por todos os pontos de transporte coletivo e acha uma maravilha! Então, como é que esses países chegaram nisso? Restringindo o automóvel e dando transporte coletivo. É claro que não vai ser de um dia para o outro, mas esta mudança é necessária.
E o senhor acha que é possível esta mudança no Brasil?
Archimedes: Sim, ela vai ter que acontecer. Em São Paulo, por exemplo, já vemos algumas mudanças. As ciclovias ainda são conturbadas porque as pessoas não estão acostumadas. Mas se você for à Holanda ou Dinamarca, isso é normal. Porém, aqui não. Se você encontra alguém de bicicleta, pensa que é maluco. Mas veja a diferença: as nossas ciclovias daqui de Bauru ligam o que a quê? Se a pessoa mora no Jardim Ouro Verde e vem até a Praça Portugal, ela é jogada no trânsito. Mas vai chegar uma hora em que aqui vai ficar tão congestionado, que andar em São Pulo vai ser mais fácil. Então a mudança é necessária.
E não existe o certo e o errado, né?
Archimedes: O certo é a complementação dos modos. O automóvel não vai ser eliminado, mas vai chegar um ponto que não vai usá-lo para vir trabalhar, porque fica com o carro parado o tempo todo, não é? Então, não vale a pena.
Aproveitando… o que o senhor achou da bifurcação que foi feita no final da Getúlio Vargas?
Archimedes: Olha, a ideia até que era boa! Mas o grande problema ali, hoje, é uma rotatória de baixa capacidade e a conversão naquela área não era um grande problema. O problema foi a forma como fizeram. Aliás, o problema vem antes, porque esta rotatória não atende mais esse movimento. A capacidade da rotatória é dada, em grande parte, pelo seu diâmetro, e hoje ele é muito pequeno, não comporta todo o movimento ali. O ideal é ter uma faixa separada e segregada com ‘tartaruga’, por exemplo, de forma que a pessoa não precise passar na rotatória. Seriam três faixas. Não sei porquê não pensaram nisso. Não foi uma má ideia, mas foi mal executada. Claro que nada é fácil, mas é possível. E eu dou soluções do ponto de vista técnico; todas as alternativas precisam passar por um estudo mais profundo. Às vezes, podem ter soluções até melhores. Como eu disse anteriormente: trânsito parece que é só uma mudança pontual, mas tem uma interferência muito grande. Você pode resolver um problema em um local e criar um problema em outro.
Foto aérea: Marivaldo Fly (99795-4168)