Os leitores mais jovens não tiveram a oportunidade de conhecer o nascimento e o apogeu do Largo da Estação em Bauru. Este é o nome dado a um dos mais famosos logradouros públicos da cidade – a praça Machado de Melo. O lugar passou a ser o novo “point” de irradiação do desenvolvimento bauruense, após a transferência do centro comercial do início da rua Araújo Leite, nas proximidades do atual Santuário Nossa Senhora Aparecida, para a região do Largo.

O complexo ferroviário na cidade teve início em 1905, com a chegada da Estrada de Ferro Sorocabana, unindo Bauru a São Paulo. Nesta época o município de Bauru tinha menos de dez anos. Em 1906, a Estrada de Ferro Noroeste do Brasil inaugurou o seu trecho inicial entre Bauru e Guarantã, como se fosse uma extensão da Sorocabana. O trajeto final da Noroeste contemplava a ligação desde Bauru até Cuiabá-MT.

Em 1908, o traçado previsto para a ferrovia foi modificado, passando a ter como destino final a cidade de Corumbá-MS, com extensão total de 1,62 mil km. Em 1910, chegou a Companhia Paulista de Estradas de Ferro. Somente em 1939 foi concluída a enorme e imponente estação da Noroeste, como se vê hoje, que agregava os escritórios da Noroeste, bem como os embarques e desembarques das três ferrovias. Em 1957, a Noroeste do Brasil se fundiu a 17 outras empresas que passaram a formar a Rede Ferroviária Federal S.A., sociedade de economia mista, criada com o objetivo de agregar todo o patrimônio ferroviário de propriedade da União.

A construção da estação ferroviária suscitou o aparecimento de muitas empresas comerciais no local, além de hotéis e pensões. No centro da praça Machado de Melo, havia um bebedouro de água para os animais que puxavam carroças, as quais ali faziam ponto, à espera de realização de carretos. Anos depois, na praça também foi colocado, entre os seus jardins muito bem cuidados, um monumento com o busto do engenheiro Machado de Melo, construtor da pomposa gare.

Além da estação que atendia às três ferrovias, o entorno da praça abrigou empresas tais como Hotéis Cariani, Brasil, Imperial, Estoril, Joia, Avenida, Progresso, Casa Sampaio, a filial local da empresa Dias Martins, na época um dos maiores nomes do comércio atacadista e varejista do País. Há que se lembrar que a praça funcionou por muito tempo como a estação rodoviária da cidade.

Em 1897, surgia contígua à região do Largo da Estação, a rua dos Esquecidos. Na verdade, esta rua não tinha nome e seus moradores e comerciantes se consideravam esquecidos. Mais tarde, ela se transformaria na tradicional, charmosa e histórica rua Batista de Carvalho, a mais importante via de comércio da cidade.

Pela estação de Bauru circulavam, diariamente, milhares de pessoas, chegando ou saindo da cidade; também através das ferrovias, circulavam cargas de valores vultosos. Os negócios prosperavam. Os empregos nas ferrovias, principalmente na Rede Ferroviária, eram objetos de desejos para diversas classes de profissionais. Os engenheiros da Rede amealhavam vultosos salários, comparados com o mercado de então, e muitos se candidataram a estes postos, que conferiam a seus ocupantes status singular.

O bacharel em direito e escritor Antonio Candido Pupo Oliveira (Boião), morador na cidade nas décadas de 1940 e 1950, relembra que “o nosso ‘largo da estação’ não era apenas o portal de entrada de comerciantes, compradores e viajantes, era, mais que nunca, o centro palpitante de lazer e cultura e, mais ainda, o polo centralizador dos movimentos cívicos da cidade. Ali se fazia festa, mas também se fazia política, ali recebiam as homenagens os heróis da cidade, desde os pracinhas da FEB e FAB aos jogadores de futebol do Noroeste e Lusitana em suas vencedoras campanhas nos campeonatos do interior paulista”.

Enfim, o Largo da Estação já gozou de muito prestígio e era o coração pulsante da cidade de Bauru. No entanto, sua derrocada se iniciava com o processo de privatização da Rede Ferroviária Federal, na década de 1990. A E. F. Noroeste do Brasil foi a primeira a ser vendida. Com a privatização, os trens de passageiros deixaram de circular, pois a concessão teve previsão apenas do transporte de cargas. Desde então, poucas estações ao longo do traçado ferroviário foram conservadas. Este não foi o caso da imponente Estação de Bauru, que agoniza ao longo de cerca de três décadas, a espera de sua recuperação.

Hoje, como propriedade do município, ela “respira por aparelhos”, aguardando vontade política para, não só se restabelecer, como para trazer vida novamente para aquele Largo da Estação e suas adjacências, em gradativo processo de degradação. Seria o reencontro da cidade moderna com sua história.

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