O entusiasmo com que Francine Matos fala sobre a psiquiatria é um indício de que ela escolheu a profissão certa. Porém, foram necessários alguns anos e muitas sessões de terapia para se encontrar na medicina. Formada em 1999, pela Santa Casa de Misericórdia de São Paulo, Francine se especializou em pediatria e depois em reumatologia infantil na USP.

“Na época do cursinho eu já gostava de saúde mental e dentro da pediatria, nesses anos todos, ainda parecia que não era o caminho certo. Até que chegou um ponto em que eu adoeci. Tive depressão, crise do pânico e ansiedade. Comecei a fazer terapia com a psiquiatra e, de tanto conversar com ela, percebi que o caminho era saúde mental mesmo”, conta Francine.

Mesmo após tantos anos de estudo e já com título de doutora, a médica decidiu estudar novamente, dessa vez, a psiquiatria adulto. Segundo ela, foi o momento propício para seguir na área. “Eu agradeço não ter feito antes, porque eu não teria a vivência que eu tenho hoje e não seria a profissional que eu sou hoje. O meu olhar é de alguém que já adoeceu, então eu sei o que as pessoas estão passando. Eu gosto muito do que eu faço”, revela.

Agora, já com o título de médica psiquiatra, ela inaugura uma clínica aqui na cidade para atender os adultos bauruenses.

Mas afinal, o que é psiquiatria? Quando devo procurar um psiquiatra? E qual a diferença com a psicologia? Essas e muitas outras questões também passaram pela minha cabeça ao entrevistar a Drª Francine. Portanto, confira o nosso bate-papo para saber as respostas:

– Drª, qual a principal função do médico psiquiatra?

Ajudar a restituir uma qualidade de vida geral, tentando diminuir o sofrimento e os prejuízos que as doenças mentais trazem. O cérebro é o maquinista, se não está bom, ele vai puxar o freio mais forte do que precisa, brecar antes, acelerar mais, não vai parar na plataforma correta.

Então se o cérebro está doente e é quem coordena as outras funções – coração, pulmão, rim, fígado – todo o resto pode adoecer. Então é possível ter taquicardia, falta de ar, dor de estômago e dor de cabeça quando a mente está doente, porque ela coordena tudo.

– Ainda há muito preconceito, mas quem deve procurar um psiquiatra? Quais são os sintomas? 

O mais importante, que dá para resumir, é que se há algum pensamento, comportamento ou sintoma físico que gere prejuízo ou sofrimento, o psiquiatra deveria ser procurado. Por exemplo, a pessoa fala “eu sou nervosa desde que nasci“, tudo bem, mas isso causa prejuízo, sofrimento nas relações ou perdas? Então precisa ser revisto, mesmo que seja da personalidade.

O preconceito vem porque as pessoas entendem que mente e cérebro não são corpo, mas são. Cérebro é carne, carne adoece. Quando adoecemos do coração ou do pulmão, não tem problema, mas quando é do cérebro, que causa alterações mentais e comportamentais, não é doença? É preconceito, mas tem uma lógica histórica, porque só se tratavam com psiquiatra os esquizofrênicos. Então as pessoas entendem que psiquiatra, até hoje, é médico de louco, se ela não está louca, então não tem porque ir ao psiquiatra. 

Eu fiz isso. Quando tive depressão e síndrome do pânico, eu sentia taquicardia, meu coração acelerava e parecia que eu ia morrer. Então fui no clínico-geral. Contei pra ele o que estava acontecendo, e ele falou “isso é emocional, não é comigo”. Eu perguntei: “é com quem?” Ele indicou o psiquiatra. Então olha só, não foi o primeiro médico que eu procurei, e não foi por preconceito, foi por não lembrar que eu poderia adoecer do resto do corpo por uma questão mental.

– Achei interessante você falar “se algo está te causando prejuízo é sinal de que tem que procurar um médico”. Então você pode ser estressada, mas não precisa ser? 

Não, não precisa ser. O paciente chega aqui e fala que é ansioso, mas às vezes ser ansioso não é legalSe tem prejuízo ou sofrimento, não tem porque não procurar ajuda.

Mesmo que seja a personalidade, se a pessoa está se dando mal na vida, coisas não estão acontecendo, precisa procurar alguém. Quando não precisa de tratamento medicamentoso, eu indico a terapia, a mudança de comportamento. Quando é comigo, eu ajudo.

– Falando nisso, qual a diferença entre psicologia e psiquiatria?

Na minha consulta eu olho tudo, não faço apenas a parte técnica-médica, mas entro na esfera familiar, do prazer ou não pelo trabalho, na questão social. Tenho o cuidado de anotar tudo, para depois retomar isso com o paciente. Eu converso muito, tenho essa possibilidade de escuta, a maior parte é o paciente que fala.

A minha função é médica: entender, diagnosticar e tratar. Então tento entender o sofrimento, a causa do sofrimento, fazer o diagnóstico e o tratamento. Sempre explico qual é o diagnóstico, por que eu cheguei naquela conclusão. Explico a medicação, os efeitos colaterais possíveis e tento alinhar a expectativa do período que vai tomar o remédio.

Além disso, também converso muito sobre a possibilidade de mudança (personalidade, comportamento, hábitos), porque ela não adoeceu do nada. Existem pessoas que adoecem quimicamente, mas existem pessoas que adoecem no processo. Então além de fazer a parte médica, eu busco a causa e tento conversar sobre isso para encaminhar ao psicólogo. 

– Então o seu trabalho está relacionado ao do psicólogo? 

Sim, é complementar. Existe um preconceito de que se vai ao psicólogo, não precisa ir ao psiquiatra. Mas a mente tem a parte das emoções e pensamentos e tem a parte física. Tanto a parte mental quanto a parte cerebral precisam ser cuidadas.

Eu cuido de todas as consequências do cérebro adoecido no corpo como um todo e na mente. Porque o cérebro adoecido, adoece a emoção, o humor, o pensamento e esbarra em todas as outras esferas. Não é uma coisa só, se você trabalha psicologia junto com a medicina, fica um trabalho mais completo.

– E as consultas aqui são pontuais ou existe um acompanhamento?

A gente sempre faz uma primeira consulta, que dura, em média, 1h. Eu tento entender de forma mais ampla o que está acontecendo e fazer uma suspeita diagnóstica. Se a gente consegue fazer isso em uma primeira consulta, instituímos o tratamento e, diferente das outras doenças clínicas, as doenças em psiquiatria não se curam tão rápido.

Geralmente o mínimo de tratamento são seis meses e no máximo a vida toda. Não tem uma determinação de número de consultas, tudo depende da evolução, do tipo de doença e da gravidade.

Após a primeira consulta, marcamos um retorno mais rápido para eu ver se a medicação foi legal, se o paciente se adaptou e não teve efeitos colaterais. Depois, se der, a gente segue a cada dois ou três meses. Mas não é tão rápido quanto uma dor de cabeça, primeiro porque os remédios demoram mais para fazer efeito. Geralmente, as pessoas já vêm bem adoecidas, porque elas demoram mais para buscar um psiquiatra, por conta da vergonha. Muitas vezes não aderem ao tratamento, então até ajustar a minha parceria com o paciente leva um tempo. 

Uma questão é que, às vezes, as pessoas reclamam de ter que voltar a cada três meses, mesmo estando bem ou estável. Mas existe uma resolução do Conselho Federal de Medicina que afirma que os pacientes crônicos em uso de medicamentos de uso contínuo devem ser avaliados por seus médicos, no máximo, a cada 90 dias. Tendo em vista a boa prática médica e as adaptações necessárias. Então essa norma rege que a gente precisa avaliar o paciente trimestralmente.

– O que mais te encanta na psiquiatria?

Tudo! Não tem uma coisa só, eu amo estudar psiquiatria, amo trabalhar com a psiquiatria, amo conversar com as pessoas. É muito interessante, porque é todo dia a mesma coisa, mas nunca é a mesma coisa. É a mesma doença, mas o que faz a pessoa adoecer são processos diferentes, são traumas diferentes, históricos familiares diferentes.

O final é o mesmo, porque é o mesmo cérebro que adoece, então é o mesmo mecanismo cerebral, mas o que levou até ali, são vieses tão diferentes. É muito interessante, cada pessoa que senta aqui, é uma história de vida. E a gente aprende também, como ela sofreu, como ela lidou, é um crescimento. A gente ouve histórias que às vezes mudam a nossa forma de pensar.

– Por isso você ainda continua estudando?

A psiquiatria, como qualquer doença, tem algumas nuances de sintomas, que parecem algumas doenças, mas são outras. Então é muito comum a pessoa ser tratada como ansiosa, quando ela é bipolar. Então ela está com o tratamento errado e isso se distingue com o estudo. Porque estudos que existiam há 20 anos, talvez nem falassem desse tipo de personalidade, ou não faziam distinção entre uma coisa e outra. Os estudos mostram que, o que se achava antes, hoje, não se acha mais. 

Então que as pessoas sejam responsáveis consigo e procurem um médico onde se sintam ouvidas. Onde ela possa dizer o que pensa, o processo de adoecimento e os sintomas. Tem que ser uma conversa muito respeitosa e investigativa. O psiquiatra tem que ser um detetive, porque o paciente tem sintomas que ele não sabe que são sintomas, acha que é jeito de ser. Ele tem que se sentir investigado.

Atualmente faço pós-graduação em São Paulo de Especialização em Transtorno de Humor Bipolar. E tem muito bipolar sendo tratado como ansioso.  Então é importante continuar estudando, porque coisas que se sabiam, hoje em dia se sabe mais ou sabe que já não é mais verdade. 

Serviço

Drª Francine Matos Psiquiatra (CRM 98351 /  RQE 87117)
Consultório: Rua Gustavo Maciel, 22-040, sala 31 (Edifício Altos Empresarial)
Telefones: (14) 99719-9998 / (14)3234-7438
E-mail: [email protected]
Instagram: @drafrancinematos

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