Eu detesto textos que começam com um “número X de coisas que…”. Inclusive, comecei esse aqui sem pensar se vou conseguir atingir o número de lições que prometi ali no título. Afinal, 5 é bastante coisa (nota: ao terminar de escrever, volte nesse parágrafo, confira o número de itens e apague também essa nota, seu preguiçoso).

Apesar disso, listas são didáticas porque trazem uma certa finitude prática, principalmente para os ansiosos. Quando terminar de ler a primeira, você vai parar e pensar: Ufa, agora só faltam ‘X itens -1′ para acabar.

Sei bem disso porque sou o rei dos ansiosos. Rei não, vai. Talvez membro da nobreza, filho de algum visconde da ansiedade. Filho do meio. Então ao começar a ler um texto sempre rolo umas duas ou três vezes até o fim pra saber quantos itens ainda faltam.

Com textos que tem listas numeradas isso é mais fácil, porque espera-se que o escritor tenha alguma noção de organização e distribuição do texto. Coisa que, aliás, espero que vocês não cobrem de mim. Obrigado!

1 — Aulas remotas não são aulas EAD

Eu sou professor há 15 anos, e no ensino superior, quase dez. Trabalho com EAD há pelo menos cinco e antes da pandemia eu sempre tive uma certeza: Ensino EAD e presencial não tem absolutamente NADA em comum.

Enquanto no presencial os alunos e o professor devem (deveriam) formar uma comunidade no processo de ensino-aprendizagem, aproveitando suas próprias dúvidas e competências para colaborarem juntos, durante o tempo da aula, para o desenvolvimento de um assunto, no EAD os tempos individuais são as regras, e não existe quase nenhum tempo compartilhado.

A teoria se dá em um momento, a explicação em outro, a avaliação e até as discussões em outro, e esses tempos não são compartilhados.

Assim, as aulas remotas são uma adaptação do ensino presencial com ferramentas tecnológicas, e não uma transformação de aulas presenciais em EAD. Que aliás, só funcionam com muito comprometimento e organização. Se você não tem nem um, nem outro, sugiro se matricular em algum lugar onde sua presença seja controlada por um ente externo.

2 — Aulas remotas são boas, se não forem a regra

O ensino remoto é maravilhoso. Como profissional da área da Tecnologia da Informação (se você pensa que eu pago boletos escrevendo e dando aulas vocês estão loucos, queridinhos), sempre usei e abusei da praticidade do acesso remoto para ajudar usuários e realizar tarefas a distância. E é bom? É ótchimooo!

Você consegue, sem se deslocar fisicamente, ter acesso a equipamentos que podem estar literalmente do outro lado do mundo. E isso, além de uma economia gigante para as empresas, também representa uma abordagem  sustentável.

Porém, o ensino remoto se impôs como uma necessidade durante a pandemia, e embora já tivéssemos ferramentas maduras o suficientes para essas tarefas, os usuários ainda estavam verdes. As aulas remotas como uma obrigatoriedade nos mostrou o abismo tecnológico que existe na nossa sociedade causado, principalmente, pela desigualdade social e econômica.

Vários alunos abandonaram os estudos e outros deixaram de desenvolver suas competências por dificuldades de acesso à internet, falta de equipamentos ou insuficiência de recursos tecnológicos. Entretanto, é maravilhosa a possibilidade de se oferecer aulas transmitidas remotamente em casos específicos, como um professor que tenha que se ausentar por um compromisso profissional ou acadêmico, no caso de um aluno que não possa acompanhar uma das aulas presenciais.

3 — Ensino híbrido é ruim, mas é melhor do que nada

Priscila Cruz, presidente executiva do Todos pela Educação disse em uma entrevista que “o Brasil vai pagar um preço muito alto por escolher abrir bar antes de escola”. Não quero nem me aprofundar na questão da importância de essa ou outra atividade econômica, mas uma coisa é certa: priorizar as atividades econômicas não-essenciais em detrimento das escolas nos planos de retorno diz muito sobre nós como país.

Essas escolhas obrigaram as aulas a serem retomadas em um ambiente desconfortavelmente perigoso para professores e alunos, com a necessidade do uso precário da infraestrutura das escolas para o monstro de Frankstein que chamamos de ensino híbrido: uma gambiarra pedagógica onde o professor tem que lidar com dois tempos didáticos completamente diferentes, com alunos em uma aula remota e alunos em aula presencial simultaneamente.

Claro que esse tipo de ferramenta se justificaria em 2020, durante o pico da pandemia, com discentes e docentes fazendo testes e aqueles que fossem de risco permanecessem em casa. No entanto, o que vimos foi um total abandono das instituições de ensino que agora ainda têm que se debater sobre as soluções mal-ajambradas para a cobertura vacinal deficitária.

Apesar disso, o ensino híbrido é hoje uma é a única forma de atingir 100% do alunado.

4 — Ir para a aula é difícil, e é assim mesmo

Ninguém gosta de sair do conforto. Aliás, uma das maiores falácias dos gurus de coaching e autoajuda é o tal sair da zona de conforto. Só se sai de uma zona de conforto para ir para uma maior, com varanda gourmet e closet integrado.

O grande Professor Clóvis costuma dizer que o processo educativo pressupõe dor, e ir para aula é, no mínimo, difícil, para não dizer desconfortável. É possível gostar de estudar, ter prazer nos estudos e mesmo assim aceitar que é um processo que exige dedicação e é cansativo.

E depois de mais de um ano vendo aulas de pijamas, voltar para as salas de aula, com carteiras apertadas, os custos de deslocamento e os salgados secos e caros representa um belo sacrifício. Mas olha, é assim mesmo. O processo educacional exige, além das competências mnemônicas, o desenvolvimento de atividades motoras e visuais que se associem às memorias.

Isso quer dizer que a aprendizagem se dá na aula, mas também se dá no caminho de ida e volta, nas atividades antes e depois, na conversa com o alunos enquanto se mordica aquele fofinho tenebroso da cantina. E sempre vai ser, até inventarem o upload de código direto no cérebro como em Matrix, embora até esse método exigisse uma porradaria na sala do Morpheus para avaliação.

5 — As aula presenciais não vão acabar e é logico que vão mudar

Cem anos é um período de tempo minúsculo em termos históricos. E é esse período mais ou menos que nos dividem das primeiras escolas com a metodologia que usamos hoje. Se olharmos mais de perto, veremos que nos últimos 30 anos as instituições de ensino tem evoluído e se especializado com o ensino mais tecnicista ou mais humanista, básico ou especializado.

Hoje está claro que, não só o docente deve ser especializado, mas também a infraestrutura e o ambiente, bem como a metodologia. Uma aula de tornearia mecânica pode encontrar dificuldades em um ambiente remoto ou em uma sala de aula clássica, enquanto o professor de filosofia pode não precisar de nenhuma ferramenta específica para as suas aulas, exceto bons livros e alunos curiosos.

Portanto, não, as aulas presenciais não vão acabar, mas vão passar a ser mais uma das etapas do processo formativo, que deve variar em função do nível de escolaridade, da área do conhecimento e do tempo/duração do curso. Ou seja, escolas e faculdades com o ensino presencial não vão acabar, mas vão se transformar para atender as necessidades dos docentes e alunos.

Esse período de pandemia foi uma das maiores provações que nossa geração enfrentou, e podemos afirmar que com o aumento da população e diminuição das limitações geográficas, a próxima pode não estar distante. O que mais deveria preocupar os professores (mais do que se o ensino à distância é uma ferramenta nefasta do governo para jogar milhares de nós na rua da amargura), deveria ser em como adequar as nossas aulas para o uso com as novas tecnologias, caso isso se faça necessário. E entender que o ensino remoto e híbrido são ferramentas, assim como a lousa, que atendem a um objetivo e não são o objetivo em si.

O que não podemos nunca perder de vista é o que responderá, hoje, durante a próxima pandemia ou no próximo século à seguinte pergunta: como diabos eu vou enfiar esse conhecimento na cabecinha do meu aluno?

Confira mais textos do colunista: www.socialbauru.com.br/author/eugeniomira.

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