Rotinomancia é quinto livro do bauruense João Correia Filho que será lançado no próximo dia 20. Por livre associação, o título remete ao simbolismo das leituras de borra de café da tradição árabe. Dessa forma, o nome nasce da união da palavra rotina e do sufixo grego mancia (adivinhação).

Prestar atenção no dia a dia foi o ponto inicial do trabalho. Até porque o que mais pode haver no fundo de uma xícara de café esvaziada e esquecida em algum canto da mesa? Para o fotógrafo e jornalista, além de um retrato da vida cotidiana, uma maneira de resgatar a poesia do presente, muitas vezes soterrada pela implacável rotina. Assim, Rotinomancia une fotografia e literatura e apropria-se do universo das adivinhações a partir de imagens relacionadas a essa bebida.

À medida que fotografava os fundos das xícaras, dia após dia, João percorria de forma “quase que intuitiva” sua memória lítero-afetiva em busca de trechos de obras literárias que dialogassem com as imagens. O resultado foi uma seleção que inclui Fernando Pessoa, Inês Pedrosa, Haruki Murakami, Lima Barreto, Virginia Woolf, Gabriel García Márquez, João Guimarães Rosa, Clarice Lispector, Paulo Leminski e outros tantos escritores.

Do virtual para o real

Inicialmente, as imagens e os fragmentos literários foram publicados diariamente. As postagens no Instagram e no site da editora datam do período entre 1º e 30 de abril, justamente quando começa a quarentena por causa da pandemia da Covid-19.

O conjunto, agora transformado em livro, reúne 30 imagens e 30 textos que correspondem ao período de um mês. Portanto, sugere uma espécie de calendário poético e oráculo visual em tempos de rotinas alteradas pelo isolamento e pela perda das referências do dia a dia.

Assim, esta bebida extremamente atrelada aos hábitos cotidianos e aos encontros – o café – ganha novos olhares. O desejo do autor de Rotinomancia é contribuir com um espectro de possibilidades de interpretação de sinais que apontem caminhos para o que está por vir.

Lançamento de Rotinomancia

Atualmente, Rotinomancia está em pré-venda no site da Editora Mireveja e os cem primeiros exemplares têm frete gratuito. O lançamento virtual será no dia 20 de maio e o valor do livro é R$35 reais.

A equipe do Social Bauru conversou com o autor do livro para saber mais sobre o trabalho. Confira o bate-papo:

– Como surgiu a ideia, visto que uma xícara vazia de café é algo tão cotidiano?

Dois pontos importantes da minha carreira, que é a literatura e a fotografia, me levam muito para essa observação do cotidiano. Tanto escritores quanto fotógrafos aguçam o olhar para perceber as poesias cotidiano. Há uma busca por essa beleza que está no cotidiano que precisam ser redescobertas.

De forma mais pessoal, eu já vinha pensando em alguns projetos que tinham relação com o cotidiano. Eu trabalho em casa desde 1999, então o cotidiano de casa tem uma importância muito grande pra mim. Especificamente as imagens do Rotinomancia surgem de uma forma muito despretensiosa. Eu comecei a observar, de um dia para o outro, as xícaras de café que ficavam no escritório, por puro relaxo (risos). Mas um certo dia eu percebi que tinha uma imagem interessante. Como eu já vinha com essa história de pensar o cotidiano a partir da mancia, muito rápido, eu fiz a relação com a borra de café.

Então surge de forma despretensiosa a partir da observação do cotidiano e o meu lado fotógrafo fez com que eu começasse a fotografar. Eu sempre trabalhei com equipamentos profissionais, só recentemente que comecei a fotografar com o celular justamente por estar mais próximo do dia a dia e ter uma facilidade. Quando eu vi essa xícara eu fiz uma foto, no outro dia percebei que tinha outra imagem e fiz outra foto, rapidamente surge a ideia de ir acumulando essas fotos. A gênese do Rotinomancia é a observação do cotidiano e as imagens que se formam.

– Embora a leitura da borra de café exista, a sua proposta no livro é fazer uma relação com a literatura e não com os significados de acordo com a tradição árabe, certo?

Eu cito a tradição árabe porque é bastante forte na sociedade. Muita gente conhece a leitura da borra do café, mas na verdade a relação é com qualquer tipo de adivinhação. A ideia é um pouco dos dois, fazer a relação com a literatura e com os significados da adivinhação. Na verdade tem uma certa brincadeira e uma certa ironia.

A literatura funciona como uma janela pra mim, para que eu adentre e consiga ver mais significados nessa imagem que se forma. É um ensaio fotográfico, mas a literatura se apresenta como um potencializador da imaginação. Então trafega entre os dois, embora seja um livro baseado em ensaio fotográfico.

– Como foi o processo de relacionar as imagens com passagens literárias?

No decorrer da vida da gente, algumas cenas, alguns trechos e algumas sensações vão ficando impregnados na memória. Por exemplo, quando eu vejo algum bilhete pregado na geladeira, eu sempre lembro da cena do [livro] “Cem anos de Solidão”, de Gabriel García Márquez, em que eles começam a esquecer as coisas e a colocar o nome para identificá-las. Então eu tenho um certo repertório de textos que me marcaram. Como eu estava buscando algo intuitivo para o Rotinomancia, por ter relação com o oráculo, foi uma seleção grande parte intuitiva, pegando esses trechos que me marcaram. O poema do Mário Quintana, que se chama Exegese, marcou minha vida desde 1993, quando conheci Mário Quintana. O livro que ele autografou pra mim tem esse poema e é muito representativo da minha carreira e da forma como eu penso a poesia.

– Você também atrelou a questão da quarentena. Poderia explicar melhor a sugestão do calendário poético e oráculo visual?

Acho que tem uma intuição, talvez uma sacada ou um insight. Eu vinha fazendo essas fotos, eu já sabia que elas virariam um ensaio, eu sabia que elas poderiam ser relacionadas com literatura e já estavam com o nome Rotinomancia. Elas já vinham me acompanhando, as primeiras imagens que eu fiz são do ano passado, mas comecei a fazer com mais frequência em fevereiro.

Eu estava com 40 imagens e veio a quarentena, na hora eu falei “É isso! Acho que vamos ter uma grande alteração da nossa rotina”. Todo mundo ficou perdido e como jornalista, fotógrafo e editor consegui vislumbrar esse momento. Principalmente porque é um momento que as pessoas precisam dessas janelas que a literatura oferece. A ideia é levar um pouco de poesia para o cotidiano, que foi muito alterado. É um centralizador, um foco para dizer para as pessoas que o cotidiano tá zuado, mas tem muita poesia, procura aí!

Sobre o autor

João Correia Filho é jornalista com especialização em Jornalismo Literário e atua na área desde 1996. Colaborou como fotojornalista e repórter em importantes revistas no Brasil e no exterior, entre elas National Geographic, Caminhos da Terra, Horizonte Geográfico, Cult, Brasileiros, Entrelivros e Língua Portuguesa.

É autor de quatro guias literários: Lisboa em Pessoa (2011), À luz de Paris (2012), São Paulo, literalmente (2015) e Buenos Aires, livro aberto (2019), que inauguraram um novo estilo de livros de viagem. Com Lisboa em Pessoa foi um dos ganhadores do Prêmio Jabuti 2012, na Categoria Turismo. Apaixonado pelo livro, em 2019 criou a Editora Mireveja.

Entre em contato com o autor: (14) 99148-0190 / (14) 3245-6571 /[email protected].

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