A famosa Avenida Nações Unidas esteve sempre muito presente em minha vida como bauruense. Por muitos anos morei próximo a ela, principalmente, na época de minha infância e juventude.

No início dos anos 1970, a avenida era pavimentada na sua parte sul somente até o cruzamento com a Avenida Rodrigues Alves. Seguindo adiante deste cruzamento em direção sudeste, havia uma feira permanente, com barracas fincadas no solo arenoso, construídas com madeira. Bem em frente ao Edifício Brasil-Portugal. Do ponto de vista urbanístico, uma coisa horrível! Mas era lá que os bauruenses costumavam ir para adquirir frutas, verduras e até peixes frescos aos domingos.

Mais à frente, havia o leito do ribeirão das Flores a céu aberto, em cujas margens um grupo de garotos costumava jogar “futebol de praia”: Rútia, Pipo, Mário Rubens, José Eduardo, Serrinha, Lindoaldo, Japa, dentre outros.

A transposição de um lado e outro da região da Vila Universitária e Jardim Brasil/Higienópolis, região do atual Vitória Régia, era apenas feita pela Avenida Rodrigues Alves e por um precário viaduto na altura da Avenida Duque de Caxias. Nesta região era quase toda erodida, onde imperava o mato.

Eu costumava rodar a cidade a bordo de minha bicicleta Gulliver. Era uma sexta feira, dia 13 de agosto de 1976, mês de aniversário da cidade de Bauru, com muitas festividades. Era um dia totalmente atípico, pois a cidade receberia a visita de um presidente da república, o general Ernesto Geisel. Era período da ditadura militar. Antes de Geisel, apenas outros dois presidentes aqui estiveram, Affonso Pena, em 1908, que inaugurou um trecho da Estrada de Ferro Noroeste do Brasil, e vinte anos mais tarde, Getúlio Vargas.

Eu não poderia perder a oportunidade de conhecer pessoalmente um presidente da república. Teria que estar presente. Nesta época, eu trabalhava na Prefeitura de Bauru e a administração vivia momentos de euforia para receber o presidente. O Prefeito Luiz Edmundo Coube orientou toda a administração para proporcionar ao visitante ilustre uma acolhida digna.

Como seria esperado, à cidade se dirigiu todo um aparato de segurança do presidente e jornalistas, vários dias antes da data da visita. Carros pretos circulavam por toda a cidade. A recepção principal ocorreria nas dependências do lindo e imponente Automóvel Clube, na praça Rui Barbosa.

No dia previsto, lá estava eu com a minha bike, de prontidão na praça, pois o presidente apareceria na sacada, se dirigindo ao público acomodado na Rui Barbosa. Havia banda da Polícia Militar, muitos pipoqueiros, vendedores de amendoim, algodão doce e bugigangas as mais variadas para as crianças. Ao redor da praça e as ruas nas proximidades da Rua Batista de Carvalho estavam todas interditadas para garantir a segurança presidencial.

O presidente Geisel aportou na quadra 4 da Rua Batista de Carvalho e seguiu a pé em direção à Praça Rui Barbosa. Acompanharam o presidente, o prefeito Edmundo Coube, o vice Jurandir Bueno, os deputados Franciscato e Abrahin Dabus, o governador Paulo Egydio Martins, todos da antiga Arena.

Chegando à praça, o presidente descerrou uma placa comemorativa à sua visita e ouviu-se vários discursos das autoridades. Eu me acotovelava junto ao público para acompanhar de perto o que ali se passava. Em seguida o presidente foi para o interior do Automóvel Clube para uma reunião com prefeitos da região e acenar da sacada ao público presente. Encerrados os parlatórios, Geisel, por volta do meio dia, em comitiva se dirigiu à Jaú, para novos compromissos.

A comitiva seguiu, então, pela avenida Rodrigues Alves, cruzando a avenida Nações Unidas, até atingir a rodovia Bauru-Jaú. Com o final da cerimônia, eu e as demais pessoas presentes retornamos às nossas casas para o almoço. Pouco depois disso, a cidade ficou em polvorosa. As rádios locais começaram a dispor de informações sobre a explosão da avenida Nações Unidas, inclusive no ponto onde passara a comitiva presidencial. Neste ano, a avenida já contava com mais algumas quadras duplicadas e pavimentadas, até próximo à Duque de Caxias. Eu fui para lá, com minha bike, conferir.

Ninguém estava entendendo. Logo começaram as especulações: “atentado à comitiva do presidente”, “atentado terrorista” e tantas outras versões que a imaginação humana poderia alcançar.

Em seguida, jornalistas que acompanhavam a comitiva presidencial se esforçavam em passar informações às centrais jornalísticas, claro com a precariedade da mídia da época. Enfim, Bauru se tornou notícia nacional e internacional naquela sexta feira, 13.

Algum tempo depois, constatou-se que um caminhão com carga inflamável havia sofrido um acidente e tombado no quarteirão dois da Alameda Octávio P. Brisolla, provocando vazamento do líquido na via, sendo coletado pela rede de drenagem pluvial. A rede despejava os líquidos no ribeirão das Flores, canalizado pela Avenida Nações Unidas. Foram expelidos gases na tubulação e, com um possível fósforo ou bituca de cigarro jogado em uma boca de lobo, fez com que a Nações Unidas fosse pelos ares.

Foram dias de muita inquietação na então Capital da Terra Branca: um presidente da república por ali passou e uma de suas principais vias explodiu, quase que simultaneamente. Muita cereja para um único bolo!

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