Nascer – ir para a próxima página. Se Adão e Eva também foram nomes, para nascer, é preciso nomear. Ter nome. Nasço e nomeio. Escrever um nome… Vida e literatura escrevem nomes de mãos dadas: quem existe está escrito. Um personagem está no papel para fazer estória. E quem não está, também está, está nas entrelinhas, no subtexto. Na imaginação. Eu nasço uma palavra, escrita no livro próprio de registro civil. Prazer, palavra. Unhé, diz um nome um bebê ao ser nome na maternidade. Uma única vez na vida ganha-se um nome – uma efeméride quando do nascimento. Ser primeiro palavra, depois gente. Nascer é também escrever. Estas letras, minhas mãos dadas como palavra, comprovam uma existência. A escrita comprobatória, o nome obrigatório. O nome e a vida. Vida, com 4 letras. Uma palavra. Nome.

75 Alices, 72 Helenas e 68 Migueis nasceram em Bauru no ano passado. Cinquenta balõezinhos diferentes – soltos no céu em branco como página para caneta e lápis – cinquenta palavras, cinquenta nomes… Alice, Helena, Miguel, Arthur, Gael, Davi, Maite, Heitor, Maria Alice, Theo, Samuel, Noah, Pedro, Liz, Laura, Maria Clara, Heloisa, Ravi, Lorena, Cecilia, Antonella, Maria Luiza, Manuela, Gabriel, Bernardo, Leonardo, Joaquim, Valentina, Maria Eduarda, Maria Julia, Benicio, Lucas, Julia, Sophia, Lara, Matheus, Davi Lucca, Lavinia, Isaac, Lucca, Lorenzo, Isis, Livia, Alicia, Luisa, Maria Cecilia, Maya, João Pedro, João Miguel, Isabela.

Quem está guiando não percebe o envolvimento, mas a escuta é atenta. Entre ver o trânsito e ouvir o rádio, o primeiro parece tão habitual, rotineiro e maçante, enquanto o segundo é capaz de fazer a vida valer a pena por um instante. Você está sintonizada na Nome FM, a rádio da vida. Neste final de ano, a Nome FM promoveu um sorteio mais que especial para os seus ouvintes! Sorteamos um carro zero! Novinho em folha. E entre todos os que ligaram para a rádio, uma felizarda foi escolhida para guiar o seu mais novo automóvel zero quilômetro. Alô? Quem fala? É Cassandra. Sandra! Parabéns, Sandra! Você acaba de ganhar um carro zerinho da Nome FM. Ô meu Deus, eu não acredito, é trote?! Não é, Sandra, você está feliz? Eu estou muito! Eu nunca ganhei nada, nem bingo de quermesse, nem carta de namoro! Pois é, Sandra, hoje é o seu dia de sorte.

Quem ouviu não se conteve. Mesmo com as mãos no volante, os olhos podem descansar a vista, baixar a guarda – marejar. Mesmo cumprindo uma pequena corrida entre as ruas bauruenses, prestando um serviço. E quem chorou mesmo foi a mãe no banco de trás, com o seu bebê no colo, ninando. Pare o carro aqui, por gentileza, pediu a mãe com ternura. O motorista, lembrando a sua própria mãe já falecida, desce do carro, e abre a porta para a mãe. Obrigada. A mãe está diante do Cartório Oficial de Registro Civil das Pessoas Naturais.

Ô moça, você veio registrar o nome do seu bebê? Pois, sim! E você já escolheu? Ainda não. Olha, se quiser uma sugestão, o meu nome é Sinuhê. Obrigada, Sinuhê, este é um bom nome mesmo.

A mãe se despede do motorista. No cartório, muitas mães em fila pensam nomes. Ideias enfileiradas. Que tarefa difícil. Dar bebês a nome. Para depois, conviver com nome, dar chamamento. Eu não lembro quando soube o meu nome. Mas mãe soube, sempre soube. Alguém deve sempre saber. Alguém deve garantir o nome, garantir a existência. Lembrar você. A mãe segue ao guichê.

Senhora, tudo bem? Você trouxe o seu bebê ao cartório? Que lindo!
Teve de vir. Sabe que ele me cochichou seu nome?
Não me diga…
Pois sim. E fez questão de vir testemunhar. Essa nova geração…
E qual nome a senhora gostaria de dar ao bebê? Digo, qual nome o bebê escolheu?
Bauru.
Bauru?
Sim, ele e este lugar têm muito em comum.

De volta para casa, a mãe apresentou Bauru pela primeira vez ao irmão, Pedro. Pedro, esse é o seu irmão, Bauru, ele te trouxe esse presente. Oba, mamãe! Oi, Bauruzinho. Mãe, o nome dele é Bauru e só? E só, Pedro. Mãe tirou Bauru do colo e colocou no aconchego de Pedrinho, que estava sentado no sofá. Como ele é charmoso, mãe! Bauru dormiu.

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